Leonardo Battilana e Fabio Tarandach
No início de julho, o MPF apresentou seu parecer nos autos dos embargos de divergência em RESp 1.163.020, a ser julgado no STJ pela sistemática de recursos repetitivos, opinando pela não inclusão dos valores referentes à Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição («TUSD») e à Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão («TUST») na base de cálculo do ICMS incidente sobre a fatura de energia elétrica.
Tal discussão não é nova e, em suma, versa sobre o direito de os consumidores não pagarem ICMS sobre os valores pagos a título de TUST e TUSD, eis que, embora componham o preço final da energia elétrica, tais tarifas não se confundem com o valor pago pela energia elétrica propriamente dita e não há previsão de incidência do ICMS sobre o transporte da energia (no caso, a transmissão e a distribuição).
Em linhas gerais, as autoridades fiscais estaduais argumentam não ser possível dissociar os custos de transmissão e distribuição da energia elétrica adquirida pelo consumidor, já que — dada a sua natureza física unitária — a geração, transmissão, distribuição ocorrem simultaneamente. Diante disso, não haveria qualquer ilegalidade na inclusão de todos os custos relativos ao fornecimento da energia elétrica, já que o ICMS deveria ser calculado sobre o preço da operação.
Contudo, muito embora as autoridades fazendárias tenham a interpretação de que todos os custos relativos à atividade de energia elétrica devem compor a base de cálculo do ICMS, não há qualquer fundamento legal ou constitucional que autorize essa inclusão.
Devemos lembrar que a Constituição Federal, ao tratar a energia elétrica como uma mercadoria, não autorizou a incidência do ICMS sobre elementos estranhos ao preço da mercadoria (energia elétrica) em si.
Nesse particular, entendemos que a TUST e a TUSD não podem ser equiparadas a uma mercadoria, evidentemente. Tais tarifas são cobradas dos consumidores nas faturas de energia elétrica em função de custos pelo uso dos sistemas (transmissão e distribuição), mas que não se confundem com a energia elétrica propriamente dita.
Ao longo do tempo, tanto a primeira turma como a segunda turma do STJ (responsáveis no STJ pelo julgamento de questões envolvendo matéria tributária) proferiram decisões favoráveis aos contribuintes para reconhecer que o ICMS não poderia incidir sobre a TUSD e a TUST.
Contudo, em meados de 2017, foi aberta divergência na primeira turma do STJ que, por maioria de votos, julgou legal a incidência do ICMS também sobre as tarifas componentes da fatura de energia elétrica. Nesse contexto, a questão foi levada à primeira seção do STJ (composta por ministros da primeira e segunda turmas) para que seja uniformizada a jurisprudência a respeito da questão.
A nosso ver, embora o parecer do MPF não possua um cunho decisório em si, por seu importante papel institucional, trata-se de um indispensável reforço à defesa do direito de os consumidores de energia elétrica não se sujeitarem à incidência do ICMS sobre tais tarifas, em conformidade com a jurisprudência histórica do STJ sobre a matéria.
Por fim, esperamos que os embargos de divergência em RESp 1.163.020 deverão ser julgados conjuntamente com os recursos especiais 1.692.023 e 1.699.851, afetados como repetitivo sobre o tema.
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*Leonardo Battilana é associado da área tributária do escritório Pinheiro Neto Advogados.
*Fabio Tarandach é associado da área tributária do escritório Pinheiro Neto Advogados.
Fonte: Migalhas